26 de março de 2007

"Os ricos que paguem a crise" "um País nunca fica melhor quando a maioria do seu povo fica pior”

Bom dia!
“Os ricos que paguem a crise” é, ou melhor, foi, uma palavra de ordem lançada há anos por um sector da esquerda política portuguesa. O certo é que nunca essa palavra de ordem teve tanta actualidade. Falo-vos isto pois há dias vi uma cena num supermercado que me chocou profundamente.

Tenho consciência que o meu poder de compra anda, desde há uns anos a diminuir, que os tais aumentos de vencimento que dizem que me dão todos os anos como quem dá uma grande coisa nem de actualizações salariais podem ser chamados pois na realidade ficam, sempre, aquém da inflação e não passam, de facto, de esmolas. Mas, talvez porque a minha vinda para o continente, a drástica diminuição do meu vencimento e as despesas de instalação e montagem de mais uma casa me tem feito pensar que são estes factos que fazem eu não ter dinheiro nem para “mandar cantar um cego”.

No dia 21 de Março de 2007, na sua intervenção no Debate mensal com o Primeiro-ministro, Jerónimo de Sousa, afirmou:

“Vangloria-se o Governo com o facto de o défice das contas públicas ter ficado abaixo da meta de 4,6% definida no Programa de Estabilidade e Crescimento e apresenta esse facto como uma espécie de troféu da sua política. Nenhum aplauso, nenhuma omissão do seu discurso, nenhuma deriva em relação a este tema central do debate aqui feito pela direita impede que se coloque esta questão nuclear: é preciso saber à custa de quem e do quê se obteve este resultado.

O Secretário-geral do Partido Comunista Português acrescenta:

Podendo admitir-se que é uma “verdade de La Palisse”, um País nunca fica melhor quando a maioria do seu povo fica pior, e é isso que está a acontecer a Portugal.”
Não vou transcrever a totalidade do discurso embora vontade não falte, que m quiser lê-lo poderá encontrá-lo no sítio www.pcp.pt.

O que quero salientar é que o Governo foi buscar esta grande vitória à algibeira da classe trabalhadora, à algibeira da classe média, à algibeira de quem paga impostos que lhe são descontados na fonte. Foi buscar esta retumbante, pelo que apregoa, vitória à qualidade de vida do cidadão comum que vê serem fechadas maternidades, urgências e em vez delas vê abrir serviços privados, vê a serem empurrados para o rol dos supranumerários centenas de técnicos e quadros superiores de serviços ligados ao Estado, como Serviços de Desenvolvimento Agrários e outros.

Mas não vê os ricos serem afectados por estes acontecimentos, porque os ricos podem pagar clínicas de luxo, os menos ricos têm seguros de saúde e normalmente nem da “Caixa de previdência” ou da ADSE se socorrem e, portanto, tanto se lhes dá que as urgências encerrem ou não, que as maternidades encerrem ou não. Os ricos têm os filhos em colégios particulares, portanto não lhes diz nada que o filho de quem trabalha nas suas indústrias, nos seus escritórios ou de quem planta as couves que lhe fazem as sopas tenham que acordar uma hora mais cedo que o “Normal”, apanharem uma camioneta manhosa, ou o táxi que a autarquia coloca à disposição, porque os seus filhinhos acordam meia hora antes das aulas, têm o pequeno almoço quentinho na mesa e o chaufer à porta para os levar directos ao colégio.

Um destes dias, porque precisava de tachos para a casa onde estou e os vi num folheto de um supermercado perto, fui cedinho para a porta do dito para fazer a compra a correr e meter-me a caminho de modo a não chegar muito tarde ao serviço. Quando lá cheguei já estavam algumas pessoas à espera que as portas se abrissem. É normal pois às quintas-feiras, era quinta-feira, esse supermercado faz algumas promoções interessantes. Mas, o número de clientes aumentou significativamente o que me espantou pois não considerei que tachos, panelas e frigideiras fossem motivo para que pessoas com ar de estarem já com casa posta se levantassem tão cedo da cama. Quando a porta se abriu foi a avalanche, as pessoas não respeitaram a ordem de chegada e avançaram aos atropelos para dentro da loja. Eu lá fui avançando, perplexa com a cena, conforme podia e sempre curiosa com o motivo de tamanha correria. Qual não foi o meu espanto quando vi que as pessoas se atiravam a uma pilha de sacos de batata e chegavam a arrancá-los das mãos das outras pessoas e discutiam. A cena lembrou-me outras vistas em filmes que retratam a época da Segunda Grande Guerra e o racionamento. Cada saquinho de 3 quilos de batata custava 1 Euro e cada pessoa poderia levar 5. Ora, as pessoas digladiavam-se por 15 quilos de batata mais barata do que o normal. As batatas desapareceram num ápice e vi nos olhos de quem não chegou antes dos outros, tristeza, decepção.

Quer isto dizer que a crise é tão grande, a necessidade é tal que “meia dúzia de Euros” poupados nas batatas é significativo para o orçamento familiar. Fiquei triste, muito triste com o que vi e questionei-me: quando começarão os ricos a pagar a crise? Quando os pobres tiverem deixado de existir porque nem dinheiro para batatas têm?

Senhor Primeiro-ministro, deixe-se de falácias, de sorrisinhos de quem acha que está a fazer uma grande coisa. Ponha os ricos, efectivamente, a pagar as suas quotas-partes da crise, baixe as aposentações escandalosas e em acumulação com várias outras pensões ou mesmo com ordenados que deveriam ser pagos a quem não tem emprego e poderia ocupar esses lugares.

Que os ricos paguem a crise porque têm como pagar. Como disse, os outros já nem para as batatas têm dinheiro.

Cito, de novo, Jerónimo de Sousa
“um País nunca fica melhor quando a maioria do seu povo fica pior”

Abraços marienses
Azurara, 25 de Março
Ana Loura
2007-03-27
"Novo gestor da REN saiu da Galp há um ano com indemnização de meio milhão" In Público

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