Bom dia!
Este fim-de-semana vi na RTP Açores dois programas que me prenderam a atenção, aliás um programa e um pouquinho de outro. Num, José Hermano Saraiva falava sobre o arquipélago, o seu achamento (palavra actual para descoberta) e sobre Gaspar Frutuoso e a sua obra “Saudades da Terra” enaltecendo as belezas da ilha, a afabilidade das suas gentes, concluindo que é estranho que os portugueses viagem para o estrangeiro à procura daquilo que podem encontrar cá. Presumo que José Hermano Saraiva viaja para os Açores com passagens pagas pela RTP e desconhece as tarifas praticadas pelas companhias aéreas que servem os Açores e tornam proibitivos os lampejos patrióticos de os portugueses privilegiarem o território açoriano com a sua visita.
No outro programa, da autoria e apresentado pelo poeta Vítor Rui Dores, do qual vi um pequeno excerto, falava-se do ser ilhéu e dizia-se em jeito de conclusão que não são ilhas só os pedaços de terra cercadas por mar, mas também cidades como Lisboa poderiam ser consideradas ilhas pois as pessoas vivem, muitas, isoladas do resto do mundo. Como tudo o que dizemos estas afirmações são sempre possíveis de serem rebatidas, mas não é isso que pretendo aqui fazer.
Mas o que ouvi teve o condão de me fazer pensar e meditar na condição de ilhéu.
Eu afirmo-me ilhoa. O ter vivido em Santa Maria 25 anos, e ter vivido a ilha com a intensidade com que a vivi, de alma e coração, imbuiu-me o ser, da condição e do sentimento ilhéu. E aqui volto ao poema de José Maria Lopes de Araújo onde diz:
Mar… Sempre mar…Caminho… Sempre caminho…Sempre em frente…Sempre em frente…Mas tenho que parar!...
Nós, aqui, vemos sempre o mar para além da ilha. O mar cerca-nos mas não nos limita. Que o digam os açorianos que colonizaram Santa Catarina, os que foram para a baliação para o norte da América, os que imigraram para os Estados Unidos e Canadá, os homens de letras da cultura e da ciência que dentro da ilha viveram para além dela.
E depois há o sentimento, este querer partir porque a ilha é pequena mas depois há um constante querer voltar. O cordão umbilical que nos liga à ilha nunca é cortado. Quando chega ao Pentecostes sonhamos com os Impérios, quando chega ao Verão com a água do mar quentinha, com a Maré, as Semanas dos baleeiros, do Mar. O cheiro a massa sovada acompanha-nos para onde quer que vamos, o Senhor Santo Cristo está em cima das nossas mesas de cabeceira, este azul do céu e estas nuvens, a lua que enfeita as nossas noites como em mais sítio nenhum.
Mas ser ilhéu, é também passar a vida nos aeroportos a esperar os filhos que vêm passar férias ou a despedirmo-nos deles de olhos húmidos sem nunca nos habituarmos a que eles partam. Acho que é este, por excelência, o sentimento ilhéu: o da partida e chegada. Estamos sempre, de alguma forma a partir ou a chegar, a ver partir e a ver chegar.
Abraços marienses
Santa Maria, 17 de Abril de 2006
Ana Loura
2 comentários:
Comentário muito interessante tendo bem patente um multiplicidade de visões.
Achei oportuno deixar-te também aqui o comentário que me fizeste.
As fotos que uso, a grande maioria não são minhas, no entanto quando se clica sobre elas, saltamos directamente para o site do seu autor.
Tenho dúvidas que uma foto colocada na rede, não possa ser utilizada na própria rede, fazendo-se publicidade ao seu autor. Se não se pode usar porque as disponibiliza o autor ao público e não lhes coloca uma segurança? Se tem que se pedir, tal condição deverá estar expressa no site onde estão essas mesmas fotos.
Por outro lado, a preocupação em proteger os direitos de autor devem estar mais do lado dos autores do que dos "consumidores". Quando um autor vê uma foto sua a ilustrar algo, deverá questionar-se se deixou claro que não queria que se usasem essas fotos. Se assim não for, daqui a dias, alguém começa a processar toda a gente por usar palavras que ele tem registadas com direitos de autor e para as quais não deu autorização que se usasse. Uma imagem é para mim, semelhante a um texto, desde que seja citado, tudo estará nem. Se alguém não quiser ser citado, não deve disponibilizar as suas criações.
É esse o meu entendimento sobre os direitos de autor.
Concordo que este ainda seja um assunto pouco debatido.....
Um beijinho.
Agora que descobri este blog, vejo que andei a perder mesmo mta "coisa" boa que há na nossa terra.. excelente reflexão sobre o ser ilheu!! Desde que saí pela primeira vez (há mts anos) para estudar no continente (lx), a minha alma passou a ser um autentico cais de partida de emoçoes, nunca mais fui a mesma, nunca mais tive sossego e só encontrava algum consolo na literatura inquietante do Pessoa.
Hoje, já do lado de cá, continua a ser o mesmo cais, pq de tanto valor que dou à Amizade, muitas delas do continente vivendo cá e com alma mesmo de açoriano, de cada vez que um parte (por vezes para sempre) o meu coração chora, mesmo sabendo que nunca partirão do meu coração.. mas são familias divididas por mt mar e o meu conselho - quando mo pedem - de Amiga é "abdicar" deles (da sua presença fisica) por amor a eles e suas familias ausentes..
Mas o mar, ora liberta, ora limita: só sinto o peso da limitação naqueles dias em que a ilha se torna mesmo pequena e sombria e me apercebo que para sair dela tenho que deixar o bolso, de cidadã normal que sou, bem mais pobre..(isto para nao falar nos casos de idas forçadas ao continente, por motivos de força maior) mas pior do que isto: não temos apenas uma insularidade mas sim 9 insularidades dentro duma Mega (como está na moda dizer e contra a qual luto: mega processos, mega isto, mega aquilo..): para onde quer que queira ir dentro das nossas ilhas são os preços que sabemos!!! e muitas vezes acabamos até, por uma questão de conviniencia/utilidade, por ir parar ao continente pq o preço aproxima-se bastante do tarifário inter ilhas.. é uma pena que os nossos governantes não vejam como estamos tão longe dentro do perto e eu por acaso até vivo na ilha maior, mas sinto falta da proximidade (e afinal até saõ proximas: os kms nem são assim tantos, o mar é que os multiplica em catadupa) dos meus conterraneos que o mar separa; por vezes, naqueles dias bem clarinhos ao fim da tarde, emociono-me quando consigo avistar sta maria.. provavelmente os do grupo central nao sentirão isto (uma vez que há uma certa vizinhança visivel de várias ilhas), mas sentem outras dores da insularidade que o micaelense não sente..
bem, desculpem-me a incoerencia de pensamento, mas nunca gosto de planear a minha escrita, gosto de fazer dela uma arma de libertação de sentimentos, mtas vezes tb incoerentes e que, neste campo, oscilam entre o amar a ilha onde nasci e o querer fugir dela e não ter como.. por vezes pego mesmo num avião e rumo ilha fora (graças a deus que ainda o posso fazer, embora com limitaçoes), outras vezes um bom livro, o vir à net, etc fazem-me sair da insularidade, não só geografica, mas mental e esta é que me atormenta imenso: a mentalidade não das pessoas mais antigas e idosas, que acho maravilhosas (embora com a mentalidade do seu tempo), mas de uma nova sociedade que se vai fechando no seu pseudo-conhecimento e que trocou o essencial pelo acessorio, a substancia pela forma, vestindo cada vez mais as roupas do "estatuto", dos titulos, dos cargos (meu deus tanto cargo dirigente desnecessario a sobrecarregar o nosso orçamento e depois a culpa é do funcionário publico) ... que bom que é andar pelo continente e apanhar banhos de anonimato, que bom que é entrarmos num café e ouvir "bom dia menina/senhora" e não o habitual, pesado, por vezes até interesseiro "oh doutora, bom dia, como está?".. mas isto é um circulo vicioso: na nossa terra mta gente gosta de ser chamada pelo titulo esqueçendo-se que antes do dr está o sr (e o sr adquire-se na universidade da vida) e quem precisa deles facilmente os cativa pela sua parte mais fraca...
bem já me alonguei demais!!
Abraço a todos e mt sol na nossa alma!!
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